Publicado em: 16/05/2025 11h44 | Atualizado em: 12/06/2025 17h44
Workshop sobre resíduos sólidos avança política pública baiana de saneamento básico
Encontro apresentou minutas para regulação das normas de referência NR1 e NR7 na Bahia

O descarte inadequado dos resíduos é a realidade de 283 municípios da Bahia, estado que é o quarto maior gerador de resíduos sólidos do país, segundo dados do Plano Estadual de Resíduos Sólidos de 2024. Na busca por mudar esse cenário, a regulação dos Serviços de Limpeza Urbana (SLU) e Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU) deu um passo significativo com a realização de um workshop sobre o processo de regulamentação das normas de referência NR1 e NR7, da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), no estado. O evento é mais uma etapa do projeto EcoRegula Bahia, que desde janeiro apresenta uma agenda pública sobre o tema, em consonância com as principais diretrizes da política nacional de saneamento básico.
Promovido pela Agência Reguladora de Saneamento Básico do Estado da Bahia (AGERSA), com apoio da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), o workshop realizado nos dias 7 e 8 de abril reuniu gestores, especialistas no tema e representantes de municípios e consórcios baianos, além da sociedade civil. Foram dois dias de trocas de experiências e esclarecimentos para o aprofundamento de uma política baiana para o setor.
A Bahia encontra-se em fase elaboração da proposta de regulamentação das duas normas, que levará em conta a realidade de seus 417 municípios – com realidades muito diferentes. Durante o evento, foram apresentadas as propostas de regulamentação da NR7 e NR1 pela equipe técnica da FESPSP, detalhando a prestação, regulação e cobrança pelos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos urbanos na Bahia. Elas agora seguem para consulta pública entre os dias 10 e 25 de abril, no site da AGERSA.
Esforço coletivo
O evento aconteceu em duas etapas: no primeiro dia, de forma presencial, das 9h às 16h, no Auditório da Companhia de Engenharia Hídrica e de Saneamento da Bahia (CERB) no Centro Administrativo da Bahia (CAB); e no segundo, no mesmo horário, de forma on-line, com um total de sete painéis. A mesa de abertura, que contou com representantes de importantes instituições baianas, traduziu o esforço coletivo estadual para avançar no debate, na mobilização social e aplicabilidade formal da regulamentação.
Estiveram presentes nesta mesa o diretor geral da AGERSA, Juvenal Maynart; o coordenador da Diretoria de Manejo de Resíduos Sólidos e Águas Pluviais e Urbanas da Sedur, Mateus Cunha; o conselheiro Nelson Pellegrino, do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia (TCM-BA); o diretor de Projetos Estratégicos e Obras Hídricas da Secretaria de Infraestrutura Hidríca e Saneamento (SHIS), Marlon Alberto Melo Andrade; e o presidência da Companhia de Engenharia Hídrica e de Saneamento da Bahia (Cerb), Jayme Vieira Lima. Os gestores destacaram a importância do evento para a Bahia avançar rumo à regulamentação, que requer uma articulação entre as diferentes instâncias estaduais, municipais e da sociedade civil.
Os dados do Plano Estadual de Resíduos Sólidos (2024) revelam uma situação preocupante em relação à destinação final dos resíduos sólidos na Bahia. Apenas 50 municípios realizam a disposição adequada, em aterros sanitários. A maior parte deles, ou seja, 283, ainda faz o descarte inadequado, muitas vezes em lixões ou aterros controlados sem os devidos critérios técnicos. Os demais 84 municípios que compõem o estado não informaram os dados. Confira abaixo os principais pontos debatidos em cada painel.

Painel 1 – Regulação e estruturação dos contratos de concessão
O painel apresentou o atual contexto da regulação dos Serviços de Limpeza Urbana (SLU) e Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (MRSU) no país e como ela pode impactar a melhoria da eficiência e qualidade dos serviços. Foram destacados pontos importantes, como a estruturação dos serviços, sua fiscalização e a elaboração do plano operacional pelo titular, específico para cada município.
Na fala inicial, o professor Elcires Pimenta Freire, coordenador de projetos da FESPSP, pontuou os “grandes desafios” da regulação, que envolve diferentes atores (instâncias públicas, mercado e sociedade), contratos complexos e pontos de difícil consenso, como em relação à cobrança pela execução dos serviços. Ele lembrou que a cobrança foi tornada obrigatória em 2020, com prazo para os municípios e previsão de penalidades para os prefeitos que não a executarem, a exemplo do não acesso aos recursos federais. Na Bahia, apenas 8% dos municípios (34) cobram pelos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. “É preciso que os municípios entendam que esse é um processo muito importante e irreversível”, afirmou.
Por outro lado, o Secretário Executivo da Federação dos Consórcios Públicos da Bahia, Winston Silva, atualizou a situação dos consórcios em funcionamento no estado. Atualmente presidida pelo prefeito de Capim Grosso, Sivaldo Rios, a FEC é formada por 29 consórcios multifinalitários, que atuam em diferentes áreas. Segundo Winston, em relação à gestão da limpeza urbana e dos resíduos sólidos, a ação dos consórcios esbarra na falta de orçamento dos municípios e na dificuldade de implementar uma taxa ou tarifa pelo serviço.
Ele citou o exemplo do Consórcio Ciapra Baixo Sul, que já está em um avançado processo de organização, e afirmou que os demais trabalham na elaboração de seus Planos de Resíduos Sólidos. “Nós incentivamos os municípios a realizar seus planos, identificar problemas e buscar parcerias para financiar os projetos”, afirmou Winston, acrescentando que é preciso fazer os prefeitos tenham confiança no processo de gestão da limpeza e dos resíduos sólidos.
Também participaram da mesa o doutor em saúde pública Alceu Galvão e a especialista em regulação Éllen Dânia Santos, ambos da FESPSP.

Painel 2 – Programas de Parceria de Investimentos (PPIs) na área de resíduos sólidos
O Programa de Parceria de Investimento (PPI) é a principal linha de fomento para as Parcerias Público Privadas (PPPs) do país, na área de resíduos sólidos urbanos. Em participação on-line, Pedro Alves Duarte, da Secretaria Especial do Programa de Parceria de Investimentos (PPI), do Casa Civil da Presidência da República, falou sobre os principais programas em vigência, que envolve articulações entre o Poder Legislativo, órgãos de controle, de licenciamento, governos estaduais, prefeituras e concessionárias, entre outros.
Criada em 2016, a Política Pública de Fomento a Concessões e Parcerias nasceu a partir de uma demanda por mais apoio e suporte para municípios, estados e consórcios na estruturação de projetos. O principal mecanismo é o Fundo de Estruturação de Projetos (FEP), de 2017, gerido pela Caixa Econômica, que faz negociações diretamente com os consórcios. Segundo Pedro, o FEP garante a contratação de consultorias nas áreas técnica, econômica e jurídica.
Atualmente, a carteira de projetos, via FEP, conta com 39 consórcios públicos, sendo 20 no Nordeste, 3 no Centro Oeste, 5 no Sul e 8 no Sudeste, envolvendo investimentos de mais de R$ 21 bilhões. No total, são cerca de 511 municípios e 10 milhões de pessoas impactadas. Entre os 17 projetos em andamento, 15 estão em estruturação e 2 já foram licitados. Outro exemplo trazido pelo técnico: os contratos através da linha financiada através do BNDES, com negociação direta com os estados. É o caso do Amapá (que envolve 16 municípios) e de Goiás (que envolve mais de 200 municípios). Como principais vantagens das PPPs, ele citou o investimento privado, desoneração fiscal e operacional dos municípios, inovação, aderência à legislação, metas de eficiência e remuneração conforme rendimento. Na comunicação também foram apresentadas as dez Diretrizes Federais para projetos de Resíduos Sólidos Urbanos, que traz metas para estruturação tarifárias, educação ambiental, coleta seletiva e valorização dos catadores.
Painel 3 – Minuta traz proposta detalhada sobre regulamentação da NR7 pela AGERSA
Neste painel foram detalhadas as condições gerais para a prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, seja de forma direta ou através de concessão no âmbito dos municípios ou consórcios regulados pela AGERSA. A minuta traz 131 artigos que tratam de diferentes aspectos, por exemplo, da formalização dos contratos de terceirização, de como deve ser a coleta dos resíduos sólidos domiciliares e equiparados – nas áreas urbanas e rurais – sobre a coleta seletiva, as Estações de Transbordo (ETRs) e disposição final dos resíduos em aterros sanitários.
Apresentado por Éllen Dânia Santos, especialista em Regulação de Serviços Públicos (FESPSP), o painel também trouxe o detalhamento sobre a fiscalização dos serviços e sobre a importância do plano operacional elaborado pelo titular ou concessionário. A minuta será disponibilizada para consulta pública no site da AGERSA até o dia 25 de abril.
Painel 4 – Experiências nacionais com a regulação dos SLU e SMRSU
Representantes de três importantes agências reguladoras nacionais falaram sobre a atuação, complexidade e desafios em duas regiões: São Paulo e Santa Catarina. Danielle Lodi, Gerente de Regulação de Resíduos Sólidos e Drenagem Pluvial da Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (ARSESP) explicou sobre o atual momento na agência paulista, que atua junto a 78 municípios; enquanto André Goetzinger, Gerente de Estudos Econômicos-Financeiros e Ricardo Habner, Gerente de Saneamento Básico da Gerente de Saneamento Básico da Agência Intermunicipal de Regulação de Serviços Públicos (AGIR), trouxeram a experiência da atuação pioneira da agência em Santa Catarina. Já Débora Francato, Analista de Fiscalização e Regulação da Agência Regional dos Serviços de Saneamento das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (ARES- PCJ), falou do trabalho junto aos 81 municípios paulistas, que atendem a mais de 10 milhões de pessoas.
Além de uma pequena retrospectiva das trajetórias das agências, os técnicos defenderam como a regulação precisa estar adequada às realidades regionais – que lida com escassez de pessoal e de recursos – e como ela pode ajudar na padronização e organização da prestação dos serviços e até mesmo na obtenção de dados confiáveis sobre os municípios.
Painel 5 – Desafios de implementação da cobrança do SMRSU
A comunicação trouxe a experiência da agência reguladora Aris, que agrega 41 municípios da Zona da Mata de Minas Gerais, em relação à cobrança de serviços. Murilo Pizato, Diretor Administrativo e Financeiro da agência, destacou que a cobrança é um “grande processo de convencimento”, que começa com a própria equipe da reguladora, que precisa compreender sua importância para que o processo de regulação efetivamente aconteça. Depois da equipe interna, é preciso convencer as equipes técnicas dos municípios e depois o corpo político formado por prefeito, câmara de vereadores e outros representantes dos municípios. Só depois, a população geral deve ser comunicada e convencida de que será beneficiada ao pagar pela coleta e tratamento de resíduos sólidos.
O especialista destacou a importância de campanhas de comunicação eficientes para convencer a população de que a cobrança, além de obrigatória, é fundamental para um serviço de qualidade. Além disso, cada agência precisa chegar a um “modelo ideal” que atenda a realidade municipal e que seja socialmente justa. No município de Muriaé, que integra o consórcio, a cobrança já foi implementada e é cofaturada junto com a tarifa de água. Segundo o procurador do município, Aloizio Guarçoni Baêssom, houve uma boa aceitação da cobrança pelo serviço por parte da população.
Painel 6 – Minuta para Cobrança do SMRSU
O último painel detalhou a norma de referência NR1, que trata da sustentabilidade econômico-financeira dos serviços, por meio de cobrança de taxa ou tarifa. Os contratos precisam definir a estrutura e os parâmetros da cobrança, que pode acontecer de diferentes maneiras, como através da correlação entre o consumo de água e a produção de resíduos sólidos. Ou através da criação de uma fatura específica para o serviço. E prevê, por exemplo, a existência de tarifas sociais para pessoas de baixa renda, por meio de subsídios tarifários e fiscais.
A minuta referencial da AGERSA foi apresentada pelo doutor em engenharia e gestão Pedro Simões, e segue em consulta pública até o dia 25 de abril.